segunda-feira, 16 de maio de 2011

Estruturalismo linguístico.

Aqui vai um resumo de "Introdução a Linguística: 2 - Estruturalismo Linguístico: alguns caminhos" de Rodolfo Ilari com algumas considerações minhas a respeito do assunto.

O estruturalismo teve sobre os estudos da linguagem, no Brasil, um impacto enorme. Seu advento se deu durante os anos de 1960 e coincidiu com o reconhecimento da Linguística como disciplina autônoma. Nessa época, muitos professores e pesquisadores foram atraídos a sistematizar suas doutrinas, como foi o caso célebre de Mattoso Câmara Jr.
Por volta de 1970 o estruturalismo já era, no Brasil, a orientação mais importante nos estudos da linguagem e contribuiu para a criação do linguista que passou a ter um espaço próprio, como os gramáticos e os filólogos. O estruturalismo linguístico se impôs no Brasil e venceu resistências de outras tradições e análises, mas apesar disso não se deve pensar no estruturalismo linguístico como um movimento forte e coeso porque havia oposições.

No Rio de Janeiro (ÊÊÊ *-*) atuou desde a década de 1930 Joaquim Mattoso Câmara Jr, que foi um profundo conhecedor da Linguística produzida na Europa e na América. Seu livro foi o primeiro manual de Linguística publicado na América do Sul.

Em São Paulo, o estruturalismo linguístico se fez presente nos cursos de graduação e pós-graduação da USP, onde atuaram nomes como Eni Orlandi, Izidoro Blikstein e Cidmar Teodoro Paes. Esta geração de professores era parcialmente formada por antigos bolsistas renomados da França, que criaram condições para a releitura de autores como Luis Hjelmslev, Roland Barhes e Ferdinand de Saussure.

Vamos começar abordando a tradição estruturalista européia. Para a firmação do estruturalismo na Europa, foi altamente relevante o sucesso do livro Cours de linguistique générale, publicado em 1916 como obra póstuma de Ferdinand de Saussure. O livro não foi escrito por Saussure, mas sim por seus alunos da universidade de Genebra, o que causou dúvidas sobre o "verdadeiro" pensamento do mestre e gerou uma série de obras buscando desvendar as "verdadeiras" teorias de Saussure. Por isso o estruturalismo linguístico também teve influências desses outros Saussures.

Saussure elegeu como noção central para a compreensão do fenômeno linguístico a noção de valor, que só pode ser compreendida à luz de uma série de distinções teóricas, como língua x fala, forma x substância, noções de pertinência, de signo, significante e significado.

Saussure chegou à distinção entre língua e fala observando fatos quotidianos, entre eles o jogo.

Em Saussure, o jogo é evocado antes de mais nada para contrapor os inúmeros desenvolvimentos que se podem prever a partir da "regra do jogo" ao conjunto sempre limitado de jogadas que efetivamente se realizam quando o jogo acontece. A idéia de que no jogo de xadrez são possíveis certas jogadas, mas não outras (...) leva, em suma, a valorizar o que não se observa, ou seja, "a regra do jogo" encarada como possibilidade jogo, ou no caso da língua, como condição de comunicação. (Introdução a Linguística - P.57 - Grifos meus)

Por esse caminho, chega-se à mais fundamental das oposições saussurianas, a que se estabelece entre a língua e fala, ou seja, entre o sistema e os possíveis usos do sistema.
Para Saussure, o sistema era abstrato e se opunha aos episódios comunicativos historicamente realizados. Dessa forma, Saussure estabeleceu que o objeto específico da pesquisa linguística deveria ser a "regra do jogo", isto é, o sistema.

A oposição entre os atos linguísticos concretos e o sistema abstrato é conhecido como "oposição língua/fala" ou "oposição langue/parole".


Os indivíduos que utilizam a linguagem o fazem sempre por iniciativa pessoal, mas sua ação verbal só tem os efeitos que tem pela existência de um sistema que o usuário compartilha com outros membros da comunidade linguística de que faz parte. Por isso Saussure qualificou a língua como um fenômeno social e caracterizou a linguística como um ramo da psicologia social.

Seguindo Saussure, os estruturalistas não só entenderam que seria preciso tratar separadamente do comportamento linguístico das pessoas e das regras a que obedece esse comportamento, mas ainda entenderam que o uso individual da linguagem (a parole), não poderia ser objeto de um estudo científico.

Voltando à metáfora do jogo e ao conceito de valor, todo mundo sabe que é possivel substituir uma peça perdida por um objeto qualquer e jogar o jogo sem problemas, desde que convencionemos que a peça improvisada (um botão ou uma pedra) representará a que se extraviou. Isso significa que a descrição de um sistema linguístico não é a descrição física de seus elementos, e sim a descrição de sua funcionalidade e pertinência.

Certas diferenças acústicas ou articulatórias que parecem consideráveis quando são avaliadas em termos físicos podem ser desprezadas numa análise rigorosamente linguística, porque não são investidas de nenhuma função. (Um exemplo disso é a maneira como os paulistas falam porta com o R enrolado e os cariocas falam porta sem enrolar o R). Essas diferenças de pronúncia não interessam porque levam às mesmas unidades linguísticas - no caso, às mesmas palavras.

Pensemos, por exemplo, na maneira como pronunciamos a palavra ENFIAR. A escolha de uma pronúncia sonora ou surda para esse som não modifica o sentido da palavra. (Enfiar = introduzir num orifício) - Parem de pensar maldade. - q

Mas, se grafarmos a palavra com V, por exemplo, passaremos de ENFIAR a ENVIAR e aí sim haverá mudança de sentido (ENVIAR = mandar, remeter)

Diremos então que a propriedade física depende do contexto. A diferença de forma corresponde a diferença de função. Obviamente, uma diferença física pode ser portadora de uma distinção em uma língua e não ser em outra.

Explicitando a intuição Saussuriana, Hjelmslev chamou de forma, tudo aquilo que uma determinada língua institui como unidades através da oposição; à forma, ele opôs a substância, definida como o suporte físico da forma, que tem existência perceptiva mas não necessariamente linguistica.

Assim, nas palavras carro e caro é possível distinguir uma diferença que é ao mesmo tempo substância e forma. Mas nas diferenças entre as duas pronúncias possíveis para a palavra carro só há distinção de substância.

Há uma concepção de linguagem até hoje bastante difundida, segundo a qual as palavras nomeiam seres cuja existência precede a língua e cujas propriedades são determinadas independentemente dela (É a concepção que está no mito bíblico segundo o qual Adão teria dado nomes às coisas). Foi precisamente a essa concepção tradicional e ingênua que Saussure contrapôs a noção de signo linguístico, pois os dois componentes do signo não devem sua existência a nenhum fator externo à língua, mas tão somente ao fato de que estão em oposição a todos os demais significados e significantes previstos pela língua.

Falar em valor linguístico a propósito de Saussure é antes de mais nada, ressaltar a natureza opositiva do signo. O que fundamenta a especificidade de cada signo linguístico não é o fato de que ele se aplica a certos objetos do mundo, e não a outros; é a maneira como a língua coloca esse signo em contraste com os demais.

Teoria Saussuriana de valor: A relação entre significante e significado deve ser considerada à luz do sistema em que se insere, e não nas situações práticas em que a lingua intervém ou nas realidades extralinguísticas de que permite falar.

Obs.¹ Os signos linguísticos se relacionam no sistema da língua.
Obs.² O signo é arbitrário e de natureza opositiva.
Obs.³ O signo é linear.

Idéia radical de arbitrariedade: Uma vez estabelecido que toda língua relaciona sons e sentidos, articulando-os mediante uma forma, a forma adotada para realizar essa articulação varia de uma língua historicamente dada para outra.

A noção radical de arbitrariedade tem tudo a ver com valor linguístico porque cada língua organiza seus signos através de uma complexa rede de relações que não será encontrada em nenhuma outra lingua. (P.65)

O quadro das doutrinas saussurianas não seria completo se não mencionássemos uma última posição. Trata-se da oposição entre sincronia e diacronia.

A linguística diacrônica estudaria a língua e suas variações histórico-temporais e a linguística sincrônica estudaria a língua em um certo momento, sem importar sua evolução temporal.

As gerações posteriores a Saussure não só aceitaram o desafio de descrever as línguas estudadas mediante cortes sincrônicos, mas também começaram a interessar-se por línguas difíceis de abordar num certo momento histórico, como as línguas ágrafas ou as variantes não-padrão das línguas de cultura. Isso proporcionou um estudo livre da influência da tradição gramatical greco-latina e proporcionou uma visão da história como uma sucessão de sincronias, o que fez com que as linguísticas estruturais fossem tipicamente sincrônicas.

E quais são essas linguísticas estruturais?

Continua no próximo post! :*

7 comentários:

  1. Parabéns pelo blog.
    Mesmo de uma forma geral, me ajudou bastante.
    Obrigada.

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  2. Eu que agradeço pela sua atenção. É um prazer poder ajudar! Beijos.

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  3. Parabéns Raquel....ajudou a "clarear" agora vou ter que aprender a jogar xadrez...rsrs. Obrigada!

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  4. Raquel, parabéns mesmo. Linguística é a maior viajem, não tenho paciência rs

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  5. Parabéns pelo Blog! :)
    Nos faça uma visitinha: https://linguisticadescomplicadaa.blogspot.com.br

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  6. Olá! Estava estudando línguistica e suas variações para uma prova que terei no dia 11/05/2017 na faculdade. Gostaria de saber se vocês têm disponíveis materiais sobre os neogramáticos, o estruturalismo da língua e conteúdos acerca também, da Gramática histórico-comparativa. Há um bom tempo que busco algo profundo na internet, no fito de evitar gastar tanto dinheiro, mas não encontro nada... :(
    Poderiam me ajudar?

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